domingo, 31 de julho de 2016

Um discurso de despedida: proibindo o pranto

Como morrem com calma homens virtuosos,
.....E exilam a sua alma num sussurro,
Dizendo alguns amigos pesarosos:
....."Parte a respiração", e outros: "Não",

Assim soframos, sem qualquer barulho,
.....Sem fazermos do pranto tempestade;
Seria profanação do nosso júbilo
.....Do amor contar aos leigos a verdade.

Traz mal’s e medos o mover da Terra;
.....O Homem calcula qual o seu desígnio:
Mas a trepidação destas esferas
.....É inocente, apesar da vastidão.

O chato amor dos sublunar’s amantes
.....(Cuja a alma é os sentidos) não consente
A ausência, porque a ausência torna inane
.....Toda a matéria-prima que o preenche.

Mas nós, por um amor tão refinado
.....Que nem nós conhecemos o seu ser
(O espírito entre os dois assegurado),
.....Não tememos o que é carnal perder.

Assim, nossas duas almas, que uma são,
.....Deva eu partir embora, não padecem
Qualquer ruptura, antes expansão
.....Como ouro lapidado até ar leve.

Nossas almas são duas co’a condição
.....Dos exactos pés gémeos do compasso:
A tua, pé fixo, não dá a impressão
.....De se mover, mas da outra vai no encalço.

E embora ela no centro esteja assente,
.....Quando a outra, porém, longe anda a vaguear,
Inclina-se p’ra ouvir a discorrente,
.....E apruma-se se aquela volta ao lar.

Assim serás pr’a mim, que necessito,
.....Como o outro pé, de obliquamente andar:
Traça perfeito a tua firmeza o círculo
.....Que no início me leva a terminar.

John Donne

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