sábado, 27 de agosto de 2016

Ode ao concreto

Meu bom velho cimento, durarás para além da minha vida,
como eu durei, assim consta, para além de alguma gente
que me tinha tomado, também, por uma espécie de via,
citando a cor dos olhos, ou o semblante.

Por isso eu louvo a tua porosa e inânime feição
não por inveja mas por ser um bem direto
parente – menos durável, em aflição
desconjuntado, ainda assim grato aos arquitetos.

Aplaudo a tua humilde – para ser mais exato,
insignificativa – origem, um rugir penetrante,
contudo condizente, na íntegra, com o abstrato
destino, fora do meu alcance.

Não é que o nada gere o seu género
mas que o futuro é por opção o pretendente
de um encontro tão às cegas quanto cego
e envolto em saia petrificada e ingente.


Joseph Brodsky

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