terça-feira, 13 de setembro de 2016

O palácio de Pã

Setembro, glorioso com ouro, qual rei
    No brilho do triunfo ataviado,
Mais claro que o estio, mais doce que Abril,
Os bosques incuba com asa infinita,
    Presença querida do humano.

As terras pintadas p’lo sol posto e nado
    Sob quente sorriso sorriem;
Mais nobre que um templo por mão levantado,
Coluna a coluna, o santuário se apruma
    Das naves sem fim dos pinhais.

Um culto eloquente, sem prece ou louvor,
    O espírito ocupa com paz,
Preenchida co’o sopro do fúlgido ar,
O odor, os silêncios, as sombras tão claras
    Quais raios crescendo e cedendo.

Pilar’s angulosos que coram longe e alto,
    Com ramo nenhum para um ninho,
Sustêm o tecto sublime e cabal,
À prova do sol, do tufão, colossal,
    Como águas paradas terrível.

Mão de homem jamais a sua altura mediu;
    Razão também não, nem temor;
A trama do bosque em tal sombra é tecida;
O sol como um pássaro cai na armadilha,
    E espalha, nevando, os seus flocos.

Plumagem só de ouro, tais flocos de sol
    Repousam na terra aos montões,
Quais pétalas soltas de rosas sem c’roa
No chão da floresta sombrosa e dourada,
    Corada tão perto e tão longe.

As mãos insondáveis de turvas idades
    Ergueram o templo em retiro
P’ra deuses ignotos, e na ara queimaram
Os anos em pó, e a as areias que o frasco
    Do tempo esqueceu como indício.

Um templo que em milhas calcula os transeptos,
    Que tem como padre a manhã,
Que livra o seu chão do pisar dos ineptos,
Sua música é a música só dos silêncios,
    Bem mais que espectác’lo é a festança.

Sucedem-se as horas litúrgicas, nunca
    O ofício nos vela ou revela,
Nas rampas das terras sem flor’s nem verdura,
O encalço de um fauno, uma pista de ninfa
    Até ao deus Pã em dormência.

O espírito, ateado p’lo pasmo e p’lo culto
    Num êxtase sacro em braveza
Perante os tais rastos que fendem o rumo,
Só ele discerne se em torno dos quais
    Existe uma prova do deus.

Com rubro temor mais profundo que o pânico
    A mente rendida e inconcussa
Escuta a terrena e Titã divindade
Nos passos sentidos em brechas vulcânicas
    De abismos já sem o seu lume.

Por artes mais calmas que as negras magias
    Da morte, da noite e de antanho,
Que o vil frenesi que assombrava o mei’-dia
Onde o Etna se forma dos membros gigantes
    De deuses sem trono e sem vida,

Nossa alma fundida co’ aquel’ cujo sopro
    Sublima o mei’-dia do bosque
Suporta o fulgor da presença que fala
De coisas além, mais serenas que a morte,
    De um Tempo que vence e que cala.


Algernon Charles Swinburne

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