terça-feira, 6 de setembro de 2016

Sextina

A chuva de setembro cai sobre a casa,
fraqueja a luz. A velha avó
está sentada na cozinha com a criança
junto à oitava maravilha de um fogão.
Lê as anedotas do almanaque,
ri e fala para esconder as lágrimas,

julgando que o equinócio dessas lágrimas
e a chuva que bate no telhado da casa
foram ambos previstos pelo almanaque,
ainda que só fossem sabidos de uma avó.
A chaleira de ferro canta no fogão.
Ela corta pão e diz à criança,

Está na hora do chá; mas a criança
está de olhos postos na chaleira, nas duras lágrimas
que dançam como loucas no calor negro do fogão
exatamente como a chuva dança sobre a casa.
No afã de arrumar, a velha avó
pendura a inteligência do almanaque

na sua corda. Parece um pássaro, o almanaque,
pairando semiaberto sobre a criança,
pairando sobre a velha avó
e a sua chávena turvada de lágrimas.
Ela arrepia-se e diz que a casa
lhe parece fria, e põe mais lenha no fogão.

Era para ser, diz o fogão.
Sei o que sei, diz o almanaque.
Após ter posto mais firmeza na casa
que no caminho para lá chegar, a criança
acrescenta um homem com botões como lágrimas
e, orgulhosa, mostra o desenho à avó.

Secretamente, contudo, enquanto a avó
está atarefada em roda do fogão,
as pequenas luas caem como lágrimas
de dentro das páginas do almanaque
para dentro do canteiro de flores que a criança
colocara com primor em frente da casa.

É tempo de plantar lágrimas, diz o almanaque.
A avó canta para a maravilha do fogão
e a criança volta a desenhar uma inescrutável casa.


Elizabeth Bishop

Sem comentários:

Enviar um comentário